Especialista
critica a burocracia e diz que o coordenador pedagógico deve se aliar a outros
colegas para não se sentir sozinho
Celso
dos Santos Vasconcellos já foi professor, coordenador pedagógico e gestor
escolar. Ao longo de sua extensa carreira de educador, participou de inúmeros
processos de planejamento nas escolas e gosta de dizer que aprendeu muitas
lições. "Às vezes, há uma tentação enorme de ficar gastando tempo com
problemas menores, quase sempre da esfera administrativa ou burocrática.
Justamente por isso é tão importante planejar o planejamento", afirma.
Doutor em Educação pela Universidade de São Paulo, mestre em História e
Filosofia da Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e
autor de diversos livros sobre esse assunto, o especialista fala na entrevista
a seguir a respeito dos meandros do processo de elaboração das diretrizes do
trabalho da escola.
Por onde
se deve começar um bom planejamento?
CELSO
VASCONCELLOS Depende
muito da dinâmica dos grupos. Existem três dimensões básicas que precisam ser
consideradas no planejamento: a realidade, a finalidade e o plano de ação. O
plano de ação pode ser fruto da tensão entre a realidade e a finalidade ou o
desejo da equipe. Não importa muito se você explicitou primeiro a realidade ou
o desejo. Então, por exemplo, não há problema algum em começar um planejamento
sonhando, desde que depois você tenha o momento da realidade, colocando os pés
no chão. Em alguns casos, se você começa o ano fazendo uma avaliação do ano
anterior, o grupo pode ficar desanimado - afinal, a realidade, infelizmente, de
maneira geral, é muito complicada, cheia de contradições. Às vezes, começar
resgatando os sonhos, as utopias, dependendo do grupo, pode ser mais
proveitoso. O importante é que não se percam essas três dimensões e, portanto,
em algum momento, a avaliação, que é o instrumento que aponta de fato qual é a
realidade do trabalho, vai aparecer, começando o planejamento por ela ou não.
É
possível realizar um processo de ensino e aprendizagem sem planejar?
VASCONCELLOS É impossível porque o planejamento é
uma coisa inerente ao ser humano. Então, sempre temos algum plano, mesmo que
não esteja sistematizado por escrito. Agora, quando falamos em processo de
ensino e aprendizagem, estamos falando de algo muito sério, que precisa ser
planejado, com qualidade e intencionalidade. Planejar é antecipar ações para
atingir certos objetivos, que vêm de necessidades criadas por uma determinada
realidade, e, sobretudo, agir de acordo com essas ideias antecipadas.
Em
alguns contextos, o planejamento ainda é encarado como um instrumento de
controle?
VASCONCELLOS Sim, em algumas escolas e redes, ele
ainda é um instrumento burocrático e autoritário. Em um sistema autoritário, o
planejamento é uma arma que se volta contra o professor porque o que ele disser
- ou alguém disser por ele - que vai ser feito tem que ser cumprido. Caso
contrário, ele foi incompetente. E, nem sempre, conseguimos fazer o que
planejamos. Por diversas razões, inclusive por falha nossa, mas não unicamente
por isso. No entanto, o movimento da sociedade e o processo de redemocratização
têm favorecido o conceito de planejamento como real instrumento de trabalho e
não como uma ferramenta de controle dos professores.
Qual a
relação entre o planejamento e o projeto político pedagógico?
VASCONCELLOS Nesse processo de planejar as ações
de ensino e aprendizagem, existem diversos produtos, como o projeto político
pedagógico, o projeto curricular, o projeto de ensino e aprendizagem ou o
projeto didático, que podem ou não estar materializados em forma de documentos.
O ideal é que estejam. Quando falamos do planejamento anual das escolas, temos
como referência o projeto político pedagógico.
É
possível fazer um planejamento sem conhecer o projeto político pedagógico da
escola?
VASCONCELLOS Um projeto, a escola sempre tem,
mesmo que ele não esteja materializado em um documento. Agora, o ideal é que
esse projeto seja público e explicitado. Na hora do planejamento anual, ele
deve ser usado como algo vivo, como um termômetro para toda a comunidade
escolar saber se o trabalho que está sendo planejado está se aproximando
daqueles ideais políticos e pedagógicos ou não.
Como
evitar que o tempo dedicado ao planejamento anual não seja desperdiçado?
VASCONCELLOS Nas escolas, o coordenador pedagógico
é o responsável por esse processo. É preciso prever momentos específicos para
cada tipo de assunto e ser firme na coordenação. Às vezes, há uma tentação
muito grande em ficar gastando tempo do planejamento com problemas menores,
administrativos ou burocráticos. Então, é muito importante planejar o
planejamento, reservando momentos específicos para cada assunto, e ser rigoroso
no cumprimento dessa organização. Ele precisa ser um coordenador pedagógico
forte, mas onde buscar apoio para se fortalecer? Em alguns casos, há o apoio da
direção, mas é muito importante que ele faça parte de um grupo com outros
profissionais no mesmo cargo para trocar experiências e sentir que não está
sozinho nesse trabalho.
Com que frequência as ações do planejamento anual devem ser revistas pela equipe?
VASCONCELLOS Eu insisto muito na reunião
pedagógica semanal. Na minha opinião, esse encontro não deve ser por área, e
sim com todos os professores daquele ciclo, daquele período. Se todos os professores,
por exemplo, do ciclo II do Ensino Fundamental do período da manhã estão
presentes no mesmo momento, em um dia fixo da semana, no período da tarde,
durante cerca de duas horas, o coordenador pedagógico pode montar reuniões por
área, ou por nível ou gerais, conforme as necessidades. Esse momento de
encontro é imprescindível para planejar um trabalho de qualidade com coerência
entre os professores. Além de ser um momento de socialização. Existem
professores que descobrem coisas excelentes que vão morrer com ele porque não
foram sistematizadas nem ele compartilhou aquelas descobertas. E, na hora do
planejamento, há a possibilidade de reservar um momento para isso.
Existe
algum momento que deve ser planejado com mais cuidado?
VASCONCELLOS Sim, as primeiras aulas.
Principalmente das séries iniciais. Existem estudos que mostram que a boa
relação professor/aluno pode ser decidida nessas aulas. Há pesquisas que vão
além e apontam os primeiros instantes da primeira aula como determinantes do
sucesso da atividade docente. Então, se o professor tem de preparar bem todas
as aulas, as primeiras precisam de mais cuidado. E não é só determinar os
conteúdos a ser abordados, os objetivos a atingir e a metodologia mais
adequada. É, sobretudo, se preparar, tornar-se disponível para aqueles alunos,
acreditando na possibilidade do ensino e da aprendizagem, estando inteiramente
presente naquela sala de aula, naquele momento.
Fonte:
http://revistaescola.abril.com.br/planejamento-e-avaliacao/planejamento/planejar-objetivos-427809.shtml
(acessado em 16/01/2013)
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